Resenha! Nós (Yevgueni Zamiátin)
Ficha
técnica!
Livro:
Nós
Autor:
Yevgueni Zamiátin
Número
de páginas: 344
Editora:
Aleph
Edição:
Capa Dura
Tradutora:
Gabriela Soares
Sinopse
da edição: Nós, escrito por Ievguêni
Zamiátin é a distopia original que inspirou desde grandes clássicos do gênero –
Admirável Mundo Novo, 1984, Laranja Mecânica e Fahrenheit 451 – até livros mais
recentes – Divergente e Jogos Vorazes. Em suas páginas, o autor imaginou um
governo totalitário chamado Estado Único que, supostamente pelo bem da
sociedade, privou a população de direitos fundamentais como o livre-arbítrio, a
individualidade, a imaginação, a liberdade de expressão e o direito à própria
vida. Um mundo completamente mecanizado e lógico, onde as pessoas não possuem
nomes, mas sim números, e o Estado dita os horários de trabalho, de lazer, de
refeições e até de sexo.
Então,
vamos à resenha!
Admito
que fico até meio perdido em questão de onde começar essa resenha. Falando de
um ponto de vista um pouco mais pessoal (juro que tento fazer as resenhas
imparcialmente), Nós tem uma importância bem grande para mim. Minha maturidade
no quesito literatura só surgiu quando peguei um exemplar de 1984 emprestado
com um professor de matemática, que me dava aula em 2015 (obrigadíssimo,
Evandro!), e, a partir daí, meu gosto por literatura só foi só se tornando mais
amplo do que já era, e tudo isso começou com as distopias. Não é pra tanto que
meus dois livros favoritos são Fahrenheit 451 e 1984, nessa ordem. Mas tudo
bem, o que Nós tem a ver com esses dois livros? É aí que eu aproveito a deixa
pra começar a crítica.
Não
há como responder a pergunta que finalizou o parágrafo anterior sem explicar
pra vocês como funciona esse livro. Nós é uma distopia russa, escrita por
Yevgueni Zamiatín, em 1923, mas que só chegou a ser publicada dentro da união
soviética vários anos depois, por conta de perseguição política ao nome de
Zamiatín (considerado o diabo da literatura pela mídia russa). A ideia base
usada para construir o enredo do livro é consideravelmente simples: após uma
guerra estrondosa que matou mais de 90% da população, a porcentagem restante
que sobreviveu resolve se juntar e formar uma sociedade nova, que não chegasse
ao ponto que a antiga chegou. Mas como fazer isso? Em uma alusão à passagem de
Dostoiévski no capítulo do Grande Inquisidor, em Os Irmãos
Karamázov: privando a si mesmo do seu livre arbítrio concedido por uma
entidade maior, entregando-o a uma entidade maior para que cuide dele por ti. O
modo como isso funciona pode soar um pouco confuso, mas é mais ou menos como se
você se sentisse tão assustado com a ideia de que uma escolha feita por você pudesse
gerar uma conseqüência ruim (ou até pecaminosa), que você resolve dar o poder
dessa decisão a outra pessoa, para que você se livre da culpa. O ponto é que,
no livro, essa entidade maior é o Estado.
Então
o que acontece é basicamente o seguinte: as pessoas, que agora nem nome tem,
mas são chamadas de números, entregaram sua liberdade em prol da felicidade (o
diálogo que explica isso é um absurdo de incrível). Os números são todos
iguais: se vestem com os mesmos unifs (que é a forma como chamam os uniformes
no livro), comem a mesma coisa, tem a mesma capacidade intelectual, o que os
leva a poder escolher o emprego que quiserem e, o que na minha cabeça foi
espantoso demais, como forma de abolir o ciúme e transformar o denominador da
fração da felicidade em zero (para tender a função ao infinito), as pessoas
podem escolher quem quiserem como produto sexual, o que é aprovado por uma lei
dentro do livro. Tudo no cotidiano deles é perfeitamente regrado,
desde das atividades matinais, até a hora do sono. Os números só possuem um
momento no dia em que podem fazer ações escolhidas por eles mesmos (o que
inclui o ato sexual que é barrado de olhos alheios pelas cortinas nos quartos).
Talvez o parênteses anterior não tenha feito tanto sentido porque eu esqueci de
mencionar um simples fato: tudo é feito de vidro nessa cidade.
Acho
que já deu para perceber que a noção de individualidade existente dentro do
Estado Único é zero, não? Mas até aí tudo bem. O que acontece é que,
nosso protagonista, que escreve uma espécie de diário que dá título a nossa
obra (não se preocupem que o motivo e a explicação se encontram logo nas duas
primeiras páginas), encontra uma moça que leva novos ideais em sua cabeça e o
leva a se revolucionar. OK. Acho que essa parte do roteiro é comum em alguns
dos romances distópicos que já conhecemos. Temos isso em Fahrenheit, temos isso
em 1984 e temos isso em Admirável mundo novo, ainda que levemente
diferente. O ponto em que quero chegar é que não é só essa
semelhança existente entre Nós e os romances distópicos que vieram depois.
Enquanto lemos, conseguimos achar elementos que estão presentes tanto em obras
clássicas quanto em obras modernas (inclusive, acho que divergente fez um
plágio enorme com um certo muro que tem nesse livro). Se analisarmos com
cuidado e atenção, é possível notar que o escrito de Zamiátin é, basicamente, o
pilar do gênero Distopia como conhecemos hoje. Tudo que normalmente é visto em
outros romances dentro do estilo tem seu papel aqui. Tudo. Inclusive a parte do
final chocante que costuma acompanhar todos os livros do gênero haha. É
impossível ler Nós e não notar os momentos em que ele foi referenciado pelos
outros autores.
Agora,
passando para a parte estrutural da coisa. Nós tem um roteiro simples de ser
seguido, mas uma leitura complicada em certos pontos. Como estamos acompanhando
um homem descobrindo sua humanidade, em certos momentos da trama parecemos
flutuar com suas novas descobertas e a narrativa fica meio confusa, talvez
dispersa. Mas nada que um pouco de concentração e releitura não resolvam. Isso,
na verdade, é um ponto positivo, pois a sensação que tive enquanto lia, é que
me tornava espantado e curioso ao descobrir sensações novas juntos com o
protagonista. Apesar dos pontos de complexidade, a leitura de Nós é relativamente
simples, mas não recomendo como obra de início para o gênero. É interessante,
inclusive, conhecer os títulos oriundos desse para depois lê-lo, sem contar que o
livro é de autoria de um russo! E como leitor apaixonado de literatura Russa,
posso falar que Zamiátin não decepciona em momento algum. Uma leitura fluida,
sem um vocabulário muito rebuscado (só alguns conceitos de matemática, que
tornam a coisa mais divertida), consegue prender a atenção em todos os
momentos. As personagens secundárias que permeiam a trama também tem uma
capacidade enorme de cativar o leitor, principalmente a I, que atormenta os
pensamentos do nosso protagonista. Destaque, inclusive, para os dilemas morais
que D-503 sofre ao se ver dividido entre a lógica e a emoção. A edição da
Aleph, pra variar, perfeita, nos entregando um acabamento de primeira linha (e
com uma capa maravilhosa, devo dizer) e com dois textos extras que foram muito
interessantes de se ler. E, não poderia deixar de dizer, a tradução da Gabriela
Soares é direto do russo, e não uma tradução de uma tradução, como
algumas editoras costumam fazer quando se trata de autores russos. Isso agrega
um valor inestimável ao livro, porque a essência da leitura é passada ao máximo
possível em uma tradução direta.
Não deixe desanimar pelos capítulos sem muita ação, porque até mesmo o mais simples dos diálogos esconde algo na obra de Zamiátin. E definitivamente não deixe de ler a resenha de Orwell e a carta que Yevgueni mandou a Yossif Stálin! São leituras que agregam bastante na compreensão da obra e no contexto social e histórico que ela foi escrita.
Assim como não existe um último número, não existe uma última revolução.
A
nota final, obviamente é a máxima!
5
limõezinhos
Poderei desfrutar da incrível obra descrita já que consegui comprar a minha edição. ... hahahahaha. E agradeço! Olha quem diria um prof de matemática indicando literatura!
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