Resenha! Ilíada - Homero

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Livro: Ilíada
Autor: Homero
Número de páginas: 533
Editora: Nova Fronteira
Edição: Capa dura
Tradutor: Carlos Alberto Nunes

Nossa.

Acho que não existem interjeições o suficiente na língua portuguesa que permitam eu me expressar do jeito que desejo. Essa foi a leitura que mais tomou tempo da minha vida, sem contar que foi a mais desafiadora: foi meu primeiro contato com qualquer tipo de poema épico. Não havia lido a Eneida, nem Paraíso Perdido, quem dirá Fausto. Tudo no início parecia ser um empecilho que me desmotivava a leitura, mas depois de muito tempo de luta e ardor, posso dizer que, sim, finalmente, eu acabei a Ilíada. 

Esse projeto de leitura começou despretensiosamente há quase dois anos atrás, mais especificamente em Dezembro de 2017. O mesmo trabalho que me introduziu aos clássicos da humanidade me despertou uma vontade enorme de conhecer um pouco mais sobre a cultura helênica (sem contar o fã pré adolescente de Percy Jackson de alguns anos atrás dando sua motivação interna), e foi aí que eu parti para a leitura. Já tinha tanto esse quanto a Odisseia, por conta de uma promoção linda do box da Nova Fronteira que tem os dois livros. Na época paguei apenas 40 reais. Mas, vamos ao que interessa. 

Acho que não vale a pena perder muito tempo explicando horrores da história da Ilíada, jã que é quase de conhecimento geral que se trata da Guerra de Troia, mas não amplamente como a maioria (assim como eu) pensa antes de sequer conhecer o material fonte. O poema é um recorte de um ano específico da Guerra (se não me falha a memória é o nono), e dá um panorama geral, no início, de como se encontram as forças gregas e troianas nesse ponto tão duradouro do embate. O Gregos se encontram atracados em Ílio Sacra, enquanto os Troianos se preparam para a pugna terrível que irá acontecer do outro lado dos muros. Ao contrário do que todos pensam (e a capa dessa edição também dá a entender),  não existe passagem alguma sobre o cavalo de troia presente na Ilíada. Acho importante ressaltar, porque acaba sendo uma coisa que todos esperam, principalmente depois de ver o filme Troia, com Brad Pitt no papel do funesto Aquiles Pelida. Então, a partir desse início, nós leitores vamos acompanhando os fatos que aconteceram ao longo desse ano da guerra. 

Depois da leitura, tive que fazer uma quantidade considerável de pesquisa em cima da obra, para que pudesse trazer uma resenha com um embasamento decente sobre as coisas que eu falo, sem contar na importância histórica que a obra carrega. Algo que achei muito interessante é que: mesmo tendo ficado de fora da guerra e citado inúmeras vezes como uma grande aura de ameaça ao exército troiano, Aquiles é o verdadeiro protagonista do grande poema. O herói que carrega o fardo de ser o grande salvador, apesar dos sacrifícios que o envolverão ao longo da jornada. Logo de cara, no primeiro canto, somos introduzidos à verdadeira temática do poema: 

Canta-me, ó deusa, do Peleio Aquiles 
A ira tenaz, que, lutuosa aos Gregos, 
Verdes no Orco lançou mil fortes almas, 
Corpos de heróis a cães e abutres pasto: 
Lei foi de Jove, em rixa ao discordarem 
O de homens chefe e o Mirmídone divino.

(Tradução de Manoel Odorico Mendes)

Somos aqui apresentados à ideia que a narrativa se trata sobre a ira de Aquiles sobre os Dânaos. E ao analisar melhor o texto, pode-se notar de que todos os cantos são implicações de sua saída precoce do campo de batalha, após ter ficado irado com o Atrida Agamemnóne, que confiscou a escrava de Aquiles, conquistada em um dos inúmeros saques realizados. Coberto de fúria, Aquiles se despede da guerra e deixa seu povo à mercê do exército troiano. 

Acho interessante ressaltar alguns desses pontos, porque a experiência da leitura torna-se muito mais enriquecedora para aquele que começa a enfrentar o texto com uma gama de conhecimentos prévios.

Mas, agora, vamos aos pontos técnicos e minha experiência pessoal. 

Acho que, para um leitor completamente desacostumado com esse tipo de leitura, tive até uma reação boa ao início. O texto tem uma linguagem muito difícil (sem exageros), o que impede uma leitura fluida. Aqueles que têm problema com interrupções podem frustrar-se um pouco, já que o início é marcado por muitas consultas ao dicionário devido ao português extremamente arcaico utilizado durante a tradução (dá para ter um pouco de noção lendo o trechinho acima). Mas não deixe desanimar por conta disso: à medida que as expressões vão se tornando mais recorrentes, você acaba se acostumando com o vocabulário e começa a ter noção do que a palavra significa ou mesmo já sabe os significados. Por mais que sejam vocábulos consideravelmente novos em relação ao nosso atual, o texto repete muitas e muitas vezes inúmeras palavras, principalmente as que se referem à adjetivos de heróis ou sobre algo referente à guerra. Admito que uma coisa que senti falta na edição foram as notas de rodapé, que sempre tornam as leituras mais fáceis.

A parte da falta das notas de rodapé, não tenho nada a reclamar da edição da Nova Fronteira. Aparentemente a tradução é primorosa, a diagramação é ótima e não deixa as páginas apertadas com tantos versos e a capa é maravilhosa demais. Um ótimo item para quem tem a intenção de fazer alguma coleção do tipo. Admito que minha dream team de poemas épicos assim seria O box da Divina Comédia da Nova Fronteira, Fausto da Editora 34, Eneida da Martin Claret e os dois de Homero da NF. Sem contar que o material do box não é aquele papel fraco descartável, que permite um armazenamento seguro e estiloso dos seus livros. 

Dentro da minha experiência com o livro, não vou negar: sofri muito até pegar o ritmo. Como os bons atenciosos devem ter notado, a leitura durou quase um ano e meio, coisa que eu nunca havia sentido antes. A temática de alguns cantos não é exatamente a mais encantadora (como a da contagem dos navios), e isso serviu para me afastar momentaneamente da leitura. Foi algo bem próximo de Entre tapas e beijos, já que em certos momentos tinha picos de vontade de ler e em outros eu deixava ele bem escondido para não me atormentar os sonhos. Mas quando me toquei que o quão interessante era a história superava a dificuldade que eu encontrava para ler, aí eu consegui tranquilamente. Ver os deuses lutando entre si para ver quem defende quem, ou mesmo vê-los trapaceando para favorecer um herói preferido ou outro (Heitor se livrou de poucas e boas com a ajuda de divindades como Apolo e Afrodite) é algo fora de série. O imaginário mitológico grego é o traço místico que deixa a história muito mais interessante, já que inúmeros problemas, como as pestes que aterrorizaram o exército grego no início do livro, são justificadas por ações divinas. 

Por fim, acho que vale fazer uma breve ressalva: poemas épicos têm como foco a história de grandes heróis vivenciando aventuras mitológicas ou enfrentando exércitos inimigos como se fossem próprios deuses dentro da batalha. Algo que aprendi com a Ilíada é que nem mesmo os heróis estão livres de falhas. Aquiles é mesquinho e egoísta, apesar de todo o apreço por Pátroclo, seu fiel escudeiro e amigo, demonstrado ao longo das tragédias que acontecem, pode-se perceber que a personalidade do Filho de Peleu não é das melhores, o que pode trazer uma reflexão incrível acerca do papel do herói na construção da personalidade do homem na pólis e até mesmo nas vindouras sociedades (agora antigas) da época. 

Leitura indispensável para qualquer um que se preze e tenha apreço por literatura clássica. Não cabe a um mero mortal como eu dar uma classificação para uma obra tão genial quanto esta. Mas se eu desse seria 10 limõezinhos de 5. 

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