Resenha!: Macbeth (William Shakespeare) e Breve comentário acerca da adaptação cinematográfica
Livro: Macbeth
Autor: William Shakespeare
Número de páginas: 123
Editora: Martin Claret (não consegui achar a minha edição, então vou recomendar essa lindíssima da editora do coração)
Edição: Brochura
Sinopse da edição: A tragédia de MacBeth (1605) faz parte da fase de maturidade de William Shakespeare. É sua única peça que relaciona os fatos da situação histórica da Inglaterra do século XVI. Com a mestria de traduzir seu tempo, Shakespeare narra uma história pautada no regicídio — o assassinato de um regente. A partir desse tema central, tratado com imensa poética, Shakespeare relaciona fatos, versa sobre os modos e aspirações da sociedade da época e, com sua sagacidade mordaz, narra uma história com base em fatos reais. A tragédia de Macbeth apresenta e desenvolve eloquência do maior dramaturgo da literatura e foi integralmente reconhecida no século XVII, graças a Rowe, Pope e Samuel Johnson que produziram edições desse grande clássico na época.Hoje, em homenagem às coisinhas mais linda que chegou ontem pela Saraiva (para quem não acompanhou os stories, foi Otelo e outros três livros lindos), resolvi fazer uma resenha um pouco pessoalmente importante para mim. Então, preparem-se, porque apesar de eu sempre tentar me controlar, acaba saindo uma opinião pessoal bem forte que não faz muito sentido, mas que na época o livro me deixou assim haha.
Conheci Macbeth por meio de um professor de filosofia (que, inclusive, ainda é meu professor) que me recomendou a leitura enquanto eu lia crime e castigo. Como a leitura estava levando certo tempo, já que o livro é bem grande, acabei interpolando uma ou outra leitura menor durante esse período de tempo (que durou cerca de um mês e meio). Eu já estava completamente imerso na atmosfera sombria e pesada da vida deplorável de Raskolnikóv, com delírios e febres que quase que eu mesmo sentia enquanto conhecia a história do mais famoso assassino de Dostoiévski, e aí me deparo com outra tragédia: a de Macbeth. Para quem não sabe ou nunca ouviu falar da história, não se preocupem, que não darei nenhum spoiler significativo na resenha (talvez só um para a resenha não ficar monótona, mas nada que obstrua seu divertimento e choque). A sinopse da história é consideravelmente simples. Macbeth, um soldado leal a seu rei (vou tentar omitir nomes de reinos e reis para não confundir muito ninguém), era um homem honroso, que carregava seus exércitos a batalhas difíceis, mas que sempre saía vitorioso delas. A história se inicia exatamente com o final de mais uma delas (não, não esqueci das bruxas), e com o relato do guerreiro a seu rei. A ambientação aí já dá o clima bem característico da obra: muita violência, atitudes macabras e, claro, um pouco de bruxaria. Mas qual o porquê da bruxaria citada? Existem a figura de três bruxas na história, que encontram Macbeth em certo ponto e conferem a ele um destino (ou seria escolha?) que o marcaria para o ressto de sua existência. Ok, já temos informações sobre quem é nosso protagonista e que existem bruxas na história, acho que isso é um ponto fundamental para continuarmos. Parágrafo.
Até então, nada aí parece muito sombrio e macabro, e realmente não é. Tudo começa a desandar exatamente nesse encontro que citei acima: a profecia conferida à Macbeth pelas bruxas é justamente a de que ele seria rei. Mas como que isso seria possível? O rei ainda estava vivo e nosso General nem sequer era da linhagem real e não tinha aspirações em relação ao trono. Então após ter ouvido o que as três mulheres tinham para falar, ele vai embora e tenta ignorar o que havia escutado. Mas esse pensamento martela e martela em sua cabeça, e assim, ele resolve desabafar com sua esposa e contar tudo. Todos esperávamos que ela desse uma solução genial para acalmar seu marido, ou apenas o fizesse pensar em outras coisas para esquecer aquilo, mas não. Definitivamente não. Lady Macbeth é uma das coadjuvantes/antagonistas mais bem construídas que eu já vi. Uma mulher vil, coberta de escuridão da cabeça aos seus pés e que teria o seu leite transformado em fel para que o marido fosse rei. É claro que a assistência prestada por ela não envolve nenhum dos itens citados anteriormente. Ela só alimenta aquele pensamento tenebroso escondido no fundo da consciência: Macbeth deveria matar o rei e tomar o seu lugar. Não é preciso muito para saber o que acontece a seguir. Em uma cena que é o ápice de tensão do primeiro ato, Macbeth mata seu rei, deitado em sua cama e depois corre para lavar suas mãos e tirar o sangue impregnado delas.
A cena que se segue, inclusive, é uma marca muito forte ao longo de toda a peça. O general tenta com todas as suas forças lavar o sangue de suas mãos e ele nunca, mas nunca consegue sair. E tudo o que acontece a seguir é só do morro pra baixo. Macbeth assume o trono e todas as decisões que ele toma daí em diante beiram tanto a tirania e a tortura que a loucura começa a tomar conta de seu ser, com monólogos absurdos de incríveis e diálogos que eu não tenho palavras para descrever com sua esposa. E é aí que eu entro para falar um pouco da impressão que esse livro me passou.
Depois de tanto pensar sobre, parece até redundante fazer uma crítica de um livro de Shakespeare, ainda mais de uma tragédia dele (as tragédias sempre tem um toque especial a mais). Li a edição bilíngue e, mesmo sendo fluente em inglês, tive dificuldades enormes para acompanhar o dialeto da época. Contrações diferentes e vocábulos que eu nunca havia vista antes me obrigavam a voltar para a linha em português e ler por ela haha. É uma escrita impecável. Shakespeare constrói com uma precisão incrível o psicológico de suas personagens por meio de monólogos ou de diálogos, já que não havia um narrador onisciente que soubesse tudo o que as personagens pensavam. As transições e os trechos que marcam as mudanças no cenário do teatro também são imprescindíveis para quem gosta de se ambientar na história que está lendo. A ambientação obscura, a presença de Lady Macbeth como um fantasma ao longo de toda a obra, a presença das bruxas e todo o cenário de guerra e a conspiração da pólvora são fatores que estão presentes para manter, desde o início, o leitor habituado ao estilo de história que está assistindo: uma tragédia marcada por dor, morte e traição. É maravilhoso ter toda a história no ponto de vista do maior antagonista sendo o próprio protagonista. Macbeth tem inúmeros monólogos em que expressa sua loucura e seu sentimento dúbio sobre ter matado, acima de um rei, um amigo. Não é possível ler a obra e não imaginar uma Escócia escura, fria e chuvosa sob o reinado de Macbeth.
A obra é marcada por inúmeros momentos pesados, como a morte do rei, o discurso que Lady Macbeth faz oferecendo-se à escuridão, os encontros com as bruxas e, claro, o final que não tem como não classificar como uma reviravolta surpreendente. Pode-se dizer que Macbeth recebeu o troco de seu reinado tirânico na mesma moeda em que o pagou. E, nossa, eu acho que até hoje não consegui digerir aquela cena final. Gente, eu realmente não imaginava que aquilo ia acontecer. A profecia eu já imaginava como ia se cumprir, mas nossa, o final foi uma surpresa que eu tenho dificuldade de processar. E não posso deixar de chamar atenção para o mais famoso discurso de Macbeth, que inspirou muitos outros artistas e escritores (assim como Faulkner em O Som e a Fúria): acho que nele se concentra todo o pensamento de Macbeth acerca do significado que a vida tem, ou pelo menos passou a ter depois de toda a tragédia que aconteceu, e é de deixar qualquer um de boca aberta. A gama de significados que aquelas palavras podem tomar é o que torna sua interpretação mais rica, e posso dizer que, no contexto em que estava, aquele homem tomou noção de tudo de péssimo que havia feito, mas realmente não dava a mínima quanto a isso, mostrando o cinismo enraizado em sua alma ante a situação em que se encontrava.
Particularmente, não achei a leitura excepcionalmente difícil, a exceção de certas palavras rebuscadas que tive de buscar o significado durante a leitura. Um roteiro fluido, marcado por cenas fortes e pesadas, com personagens psicologicamente confusas e que conseguem deixar qualquer analista com um pouco de dor de cabeça. Foi minha primeira experiência com o autor (apesar de ter mais três obras aqui para ler), e não acho que foi um jeito que prejudicou a compreensão, já que não há nada excepcionalmente complexo em quesito de roteiro e ambientação (não posso falar o mesmo de diálogos e reflexões), mas você encontra muitas pontos que te fazem parar e pensar ao longo da leitura.
Depois de tanto falar bem sobre essa obra de arte que tanto me encantou, queria deixar apenas um pequeno adendo sobre aqueles que apreciaram ou futuramente a apreciarão: o filme mais recente, estrelado por Michael Fassbender é basicamente a melhor releitura que eu já vi de uma obra de tanta importância quanto essa. Dramatizada ao extremo, a atuação de Fassbender consegue nos transpor toda a loucura e dor que Macbeth sentia em seu estágio de tirania, seu ódio e indiferença pulsando na face obscura do ator. As cenas foram muito bem adaptadas, mantendo o tom macabro original da história e alterando o roteiro em apensas algumas adaptações que, em minha opinião, apenas enriqueceram a experiência visual. Um filme para quem tem estômago forte e, claro, não esperem um show de ação e morte, porque assim como o livro, o filme foca muito nas questões psicológica das personagens e todas as passagens temporais existentes na trama original. Ponto muito positivo para a cena da morte do rei, que conseguiu me deixar em choque, pois não esperava algo tão pesado quanto foi.
Nota final!
5 limõezinhos
Pedro Meireles
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