Resenha!: The grapes of wrath (As vinhas da ira) - John Steinbeck

Resultado de imagem para the grapes of wrath penguinFicha técnica
Livro: The grapes of Wrath
Autor: John Steinbeck
Número de páginas: 490
Editora: Penguin
Edição: Mass paperback

Steinbeck foi exatamente o meu primeiro contato com literatura clássica norte-americana na língua original. Antes disso eu havia lido apenas os últimos cinco volumes de Desventuras em Série em inglês, o que me deu uma boa noção de como lidar com ler um livro em uma língua estrangeira. Minha leitura de Macbeth foi em uma edição bilíngue, mas admito que pendi mais pro lado do Português do que pro Inglês. Mas assim, mesmo já tendo um contato base com Desventuras e sendo fluente em inglês há algum tempo, passei um certo sufoco em certos momentos da leitura. Vamos então ao que interessa.

The grapes of wrath é um livro publicado na primeira metade do século passado. Um bom contexto histórico precisa ser estabelecido antes que comecemos a falar sobre a história do livro: no final da década de 20, os Estados Unidos passaram por um grande colapso econômico, que ficou marcado na história como a Grande Depressão. Pelo nome, já é de se imaginar o que aconteceu. Basicamente, da noite pro dia, inúmeros investidores de ações na bolsa de valores perderam altas quantias monetárias. Famílias perderam o sustento mensal pois não havia mais emprego para ser ofertado. Terras tiveram que ser vendidas. O PIB do mundo inteiro caiu drasticamente. E é nesse cenário que se passa a história. 

Para aqueles familiarizados com romances brasileiros que retratam a região nordestina, sabem que a figura do sertanejo é frequentemente representada como fraca, desiludida e ignorante. Sempre vagando em um nomadismo sem fim. Um claro exemplo é a de Fabiano, um dos protagonistas de Vidas Secas, que inclusive é o próximo livro a ser resenhado. No livro de Steinbeck, quem toma o foco principal são os chamados migrants, ou algo como migrantes, em português. A situação descrita durante o livro todo é a de uma terra desolada, tomada pela desesperança frente as mudanças que o país passa. Os grandes donos de terras precisam expulsar todos aqueles inquilinos que ocupam o seu espaço. O campo precisa ser econômico em tempos de crise, ele precisa ser mecanizado para poupar tempo. E aí é que entra a história da família Joad. 

Um fato interessante é que o livro alterna, entre seus capítulos, os pontos de vista da história: em um, temos sempre a história da família, grande parte das vezes contada com o foco no filho mais velho, Tom Joad; já no outro, temos uma visão sempre de alguém de fora, ou de um panorama geral do que estava acontecendo em regiões próximas. Eu honestamente gostei bastante desses capítulos a parte, principalmente por conta de todas as reflexões do ponto de vista humano dos acontecimentos narrados. Inclusive, é muito notável, em diversos momentos da narrativa, alusões cristãs no enredo. O primeiro capítulo já começa com uma, apesar de serem sempre sutis. Uma pesquisa pós-leitura me ajudou, inclusive, a compreender muitas dessas referências a momentos bíblicos presentes na trama. O artigo se chama "Êxodo e miséria" e tem um subtítulo que envolve Vidas Secas, O quinze e essa obra. Acho que vale a pena a leitura (e ficam aqui os devidos créditos ao autor do artigo!). Mas vamos voltar ao ponto da resenha! Acho que flutuei bastante e acabei não falando muito do enredo. Mas o que acontece é que, no final das contas, a família de Tom, que havia acabado de sair da prisão, sofreu junto com todas as outras famílias que tiveram que largar a própria casa em prol de algo que não tinha ao menos algo a ver com eles. E aí se inicia uma longa road trip da família, montada em um caminhão abarrotado das coisas que todos carregavam, em direção à Califórnia. A parte legal é que aí a califórnia é vendida completamente como um lugar lindo e com inúmeras ofertas de trabalho como colhedores de frutas em grandes plantações. Acho que todos sabem como isso acaba.

Nada tenho a reclamar da escrita oralizada de Steinbeck. Completamente condizente com a posição social da família (e de metade dos EUA na época) e com o ambiente em que eles se encontram, a fala é impressa no papel do mesmo jeito que é proferida. Vocábulos como Scared se tornam Scairt, inúmeras contrações e omissões de letras em palavras e inúmeras outras situações do tipo. É um estilo muito caipiresco de se falar. Um fato curioso é que o escritor realmente dedicou um tempo da sua vida a viver com o povo migrante para escrever a obra, o que torna tudo muito mais verossímil (a dedicatória dele inclusive é: "To Tom, who lived it"). Foi uma parte extremamente divertida da leitura me deparar com vocábulos já conhecidos, mas completamente diferentes. 

Em questão de enredo, a história segue uma narrativa muito linear e simples, sendo que ela acompanha toda a jornada da família em direção à Califórnia. Mas é essa simplicidade que torna tudo mais belo. O narrador, por destoar completamente do estilo humilde e simples das personagens, confere um contraste muito grande ao leitor, podendo sentir melhor as características psicológicas descritas ali, de um modo completamente formal, sendo posta em prática como se a própria personagem estivesse ali, dialogando com você. O apelo emotivo é enorme, com passagens excessivamente tristes que podem fazer você se afastar do livro por alguns minutos para se debruçar no colo de alguém e chorar bastante. Não é exagero, de modo algum. A situação da família é tocante, e continuo exaltando que a humildade e a simplicidade de todos é o que contribui para que tudo se torne assim. A ignorância também é muito presente, mas aquilo que sempre se ressalta é a humildade. Existem inúmeras cenas que os protagonistas são ajudados por alguém que mal conheciam, e acabam acompanhando os mesmos ao longo da jornada.

A edição que li foi uma bem simples da Penguin Modern Classics, que é de mass paperback e tem um acabamento bem simples, mas que vale bastante. Tem algumas recomendações de textos de apoio no início do livro, e tem uma introdução à obra que ainda não parei para ler, mas, em geral, a edição não peca muito. Aqui no Brasil aparentemente existem apenas duas edições, e o pouco que li do pdf de uma (para tentar entender e ver como alguns termos bem orais haviam sido traduzidos), não me fez querer aproximar muito do texto, provavelmente por conta do contato já estabelecido com o idioma original que me fez estranhar as adaptações necessárias para se fazer compreender a obra.

Os simbolismos religiosos, como já citei anteriormente, são extremamente presentes, e podem facilmente ser objetos para estudos futuros das simbologias da obra. O próprio título é uma alusão a uma passagem do livro do Apocalipse. Todos os personagens têm uma fé expressamente forte, com destaque para o controverso, mas puro, Reverendo Casy, que é destaque de uma das passagens mais interessantes de toda a obra. A perda de algumas figuras na família também é um ponto muito interessante que se destaca durante a leitura. Sinto que, enquanto lia, muitas passagens tinham significados à parte, e sigo na busca de tentar decifrá-los em pesquisas que faço até o momento. O simbolismo de Steinbeck é muito bonito, gente. O final, inclusive, me faz pensar até hoje. A figura de Rosasharn, a filha da família, grávida do marido Connie, é algo envolto em certo mistério. 

O livro é leitura obrigatória para todos aqueles que tem vontade de se aventurar pelos campos da literatura estadunidense, e de preferência, leia o livro no original, porque pelo pouco que eu vi da tradução, muito da essência se perde. É um conto que qualquer um que tenha apreço pela condição humana deve ler.

Nota final:
5 limõezinhos

Pedro Meireles

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